Educação física e saúde coletiva: papel estratégico da área e possibilidades quanto ao ensino na graduação e integração na rede de serviços públicos de saúde
Este artigo se destina a propor a profissionais e estudantes
da área de conhecimentos e intervenções designada institucionalmente “grande
área saúde” algumas reflexões sobre o papel estratégico da subárea de saberes e
práticas denominada geralmente educação física, quanto a sua inserção
tanto nos serviços públicos de saúde como na formação de profissionais do campo
das ciências biomédicas. As reflexões dirigem-se, sobretudo, à subárea
mencionada, no sentido de dotar este campo disciplinar de instrumentos úteis
em relação à terapêutica, à prevenção de doenças e à promoção da saúde humana.
A proposta se apóia em interpretações de
resultados observados em práticas corporais desenvolvidas pelo Grupo de
Pesquisas Racionalidades Médicas e Práticas em Saúde no Instituto de Medicina
Social (IMS) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) desde fins da
década passada.
Entre as práticas observadas
incluem-se algumas tradicionalmente pertencentes ao campo da educação física:
a ginástica aeróbica, a hidroginástica, o alongamento, a musculação, além de
outras que não pertencem à tradição ocidental, de exercícios envolvendo o
corpo, mas crescentemente incorporadas ao conjunto de atividades da área, tais
como a ioga, o tai chi chuan, a capoeira e a dança de salão, para
mencionar as que
estudamos em espaços abertos e em academias.
Na Europa do século XVIII, aliás, dança, treinamento militar,
equilibrismo, malabarismo e artes circenses conviviam culturalmente como
formas sociais legítimas de adestrar e conferir habilidades ao corpo. Somente
nos dois últimos séculos (XIX e XX) a prática da educação física, em termos de
“atividade física”, é incluída como uma disciplina, no sentido teórico
e prático, nos quartéis, nas escolas, no desporto, que se organiza
institucionalmente em diversas modalidades, e em seguida nos hospitais, em
termos de “reabilitação” (geralmente pós-cirúrgica), com finalidade
terapêutica.
Em todos esses casos, o papel do “exercício físico” é
dominante e está ligado, se seguirmos a linha de pensamento de Michel Foucault,
à estratégia da submissão dos indivíduos à nação na história moderna, e ao
dispositivo disciplinar dos corpos para a atividade produtiva, isto é, o
trabalho.
Na sociedade civil brasileira cresce a cada dia
a noção dessa importância, não apenas em função da importância cultural do
corpo e sua “forma”, mas também, insistimos, através da crescente consciência
social que muitas formas de adoecimento e morte podem ser evitadas apenas
movimentando-se o corpo regularmente, e que modos de viver socialmente
agradáveis, resultantes da prática grupal de atividades corporais, podem
alegrar e expandir a vida, pela partilha social de valores de convivialidade.
É justamente sobre o processo de medicalização
da atividade física, e a conseqüente despotencialização do significado cultural
das práticas corporais no cuidado em saúde, que nossos projetos, investigações
e análises estarão centrados.
BAGRICHEVSKY,
Marcos; PALMA, Alexandre; ESTEVÃO, Adriana (Org.). A saúde em debate
na educação física. Blumenau: Edibes, 2003.
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